Desembargadora
Coordenadora
do Núcleo de Estudos de Mediação
Escola
Superior da Magistratura - AJURIS
“Nem
mago, nem profeta, o jurista, pensador e operador, trabalha com a
racionalidade do Direito. Atento à complexidade de seu tempo e
respeitando a necessidade de estabilização, o jurista não pode se
fechar às mudanças. Participando delas, não pode apenas aplicar a
normatização
posta, mas deve atuar na construção e revisão do Direito.
A
ele é conferido o dever de pensar o subsistema jurídico de sua
época, reconhecer aquilo em que ele pode agir assim como identificar
os fatos da vida geradores de inusitadas situações sociais ainda
não normatizadas pelo Direito. Não pode, pois, o jurista se manter
alheio ao que está acontecendo se pretender identificar quais os
paradigmas que merecem ser mantidos e aqueles a superar ou superados.(1)
Porém,
assim como ocorre do ponto de vista histórico, também no enfoque
jurídico, o processo de prognóstico deve se basear necessariamente
no conhecimento do passado, pois terá uma relação com aquilo que
já ocorreu. É necessário analisar aspectos que foram importantes,
as tendências que apontam e que tipos de problemas apresentam.(2)
Esse
é o desafio a que nos propomos. Trabalhando por longos anos na
atividade jurisdicional, percebemos que as alterações históricas
não permitem mais uma jurisdição atrelada apenas à soberania do
Estado, que não é mais possível à identificação de um juiz
inerte, terceiro imparcial a “solucionar” conflitos individuais,
não é mais possível a realização de uma jurisdição do
conflito, uma jurisdição ilhada apenas a um espaço delimitado
nacional. Os problemas são macro, os conflitos extrapolam a área do
puramente individual, o juiz não se submete mais à carga da norma
injusta, ele também não quer calar, não quer ser a boca da lei,
mas a boca do cidadão.
“História,
pensamento filosófico de uma ação comunicativa, crise de transição
e a democracia como espaço possível para uma jurisdição que
precisa ser repensada são os ingredientes para uma proposta de
trabalho.”
Iniciei
com a introdução da minha tese de Doutorado que defendi em 2003 (3),
sob a orientação do Dr. José Luís Bolzan de Morais, quando o
movimento da mediação estava começando a ser difundido, abrindo
possibilidade de atuação não somente para advogados, mas para
outros profissionais ´por seu caráter transdisciplinar. Portanto,
não só advogados, mas psicólogos, pedagogos, engenheiros, não
importa a formação básica, poderão ser mediadores. Basta ter
vontade de estar em constante aprendizado, saber ouvir e ter respeito
pelo espaço sagrado do outro.
A
possibilidade de mediação judicial em 2003 era vista com
desconfiança, motivo pelo qual o Núcleo de Estudos de Mediação,
por iniciativa do Dr. Bolzan, teve como objetivo inicial agrupar
pessoas interessadas naquilo que se chamava de “métodos
alternativos”, como base nas ADRs (Adversarial Dispute Resolution).
Tem-se o ano de 2002 como marco simbólico das atividades do NEM,.
Era o encontro semanal de profissionais que acreditavam e estavam
fazendo experiências iniciais na área da mediação. Recebi, após
a defesa da Tese, em 2004, o convite para me integrar ao grupo e
desde lá, o NEM tem me motivado a diferentes experiências tanto na
área prática quanto na vida acadêmica.
Na
época, existiam muitas resistências, especialmente no âmbito do
Judiciário. Somente em 2010, com a Resolução 125 do CNJ, quando a
mediação e os métodos consensuais foram postos como política
pública do Judiciário, é que o Tribunal do Rio Grande do Sul
percebeu a necessidade de colocar à disposição do cidadão, além
do processo adversarial, os métodos autocompositivos como a
conciliação e a mediação. O NUPEMEC e os CEJUSC em Primeiro e
Segundo Grau se tornaram referenciais para o desenvolvimento da
mediação judicial.
Atualmente,
com o Novo Código de Processo Civil (Lei 13105) e a Lei de Mediação
(Lei 13140) a mediação assume uma posição privilegiada e a
presença de um Núcleo de Estudos de Mediação é espaço favorável
ao estudo, reflexão e propostas de atuação da mediação na
comunidade, nas escolas, hospitais, comunidades.
Portanto,
15 anos de atuação ininterrupta de um Núcleo de Estudos significa
que muitas foram as pessoas a tornar isso possível, compartilhando o
entusiasmo pelo tema. Por isso, com alegria, vamos juntos festejar
esses 15 anos de caminhada, superação, integração e cooperação
social. Continuarão as reuniões de estudo, os Grupos de Trabalho e
as reuniões administrativas. Mas, além disso, teremos, no curso de
2017, palestras, oficinas e cursos!
O Núcleo de Estudos de
Mediação está em festa. É momento, então, de agradecer a todos
os colegas que por aqui passaram, os que permanecem e aqueles que
virão dele participar. Cada um, com sua fala e seus sonhos, traz sua
contribuição e fortalece a proposta da Escola Superior da
Magistratura em ter, nos Núcleos de Estudos, local adequado de
aprofundamento de conhecimentos e de repercussão social.
Gratidão
e parabéns a todos.
#
SOMOS NEM!
(1) Entenda-se
como paradigma não apenas o conhecimento compartilhado em
determinada comunidade, mas o elemento usado como base para a solução
de problemas . Segundo Thomas S. Kuhn: “Considero “paradigmas”
as realizações científicas universalmente reconhecidas que ,
durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para
uma comunidade de praticantes de uma ciência.” In: A
estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva,
2000, p.13
(2) HOBSBAWM,
Eric. Entrevista sobre el siglo XXI. 2 ed., Barcelona:
Crítica, 2000, p.14
(3) Da
jurisdição soberania à jurisdição participação . UNISINOS